“Navegar é preciso, viver não é preciso.”
Conheci essa frase como refrão de um fado elegante de Caetano Veloso chamado “Os Argonautas”. Não lembro exatamente porque, mas o poeta Fernando Pessoa era a minha referência como dono dessa frase. Só que não. Pompeu, um general romano que viveu em 70 a.c, motivava os marinheiros a alistarem-se em expedições marítimas de altíssimo risco como estímulo ao desenvolvimento social, cultural e religioso do povo. É dele a frase “Navigare necesse, vivere non est necesse.” Muito mais tarde, foi Petrarca, um poeta italiano do século XIV quem cunhou sua tradução “Navegar é preciso, viver não é preciso.”
A sentença encerra, em si, o significado da navegação como fonte da expansão do espírito humano num dado momento da nossa remota história.
Navegar é preciso porque é a perfeita combinação da matemática, da astronomia, da física e dos fenômenos da natureza. A tecnologia tornou tudo isso ainda mais exato e um tanto mais complexo (nada vem de graça). O “é preciso” remete ao “é necessário” buscar outros mares, do contrário quão chances serão perdidas? E viver? O sentido de imprecisão, bem menos altruísta do que seu sentido original, mas tão libertário quanto, é fruto do nosso português. Imprecisão da vida, das dúvidas, o risco, o ato de ter que fazer algumas escolhas e, sobretudo, do efêmero. E a certeza de lidar com perdas pelo caminho.
Vendo esse mundão de Deus, dá pra ter uma ideia do que “buscar outros mares” acrescentou à evolução humana, seja de bom ou de nefasto. Desafiar-se constantemente é o caminho para o desenvolvimento de um grupo, um país ou uma única pessoa. Renovar-se, buscar aprender algo que não se sabe, percorrer caminhos que não se conhece, permitir-se correr alguns riscos em nome da experiência. É assim na vida ou no trabalho e ir contra isso é negar a própria natureza humana.
Se um dia, o acordar for para se repetir, grita a necessidade de um plano, de juntar as tralhas e fazer mudanças.
Ansiedade, insegurança, medo. O medo de modificar algo que parece seguro, de sair da zona de conforto e mexer-se, sempre vai contrastar com o ímpeto da própria mudança. O medo de se expôr ao ridículo, de ter que perder e ganhar todos os dias. Não importa. O apego adoece, a água parada apodrece. Sejamos rios, onde a água que corre nunca é a mesma. Sendo a morte e as contas as únicas certezas as quais temos por companhia em nossas vidas, o resto é só mudança. Navegar é preciso, viver não é preciso…”